Há filmes assim, que nos deixam em estado de alguma ansiedade, em frenesim involuntário, com mais perguntas que certezas. “Odete” de João Pedro Rodrigues é uma obra que tem esse efeito. - “Gostaste?” “Não sei, deixa-me pensar que já te digo”. E a dificuldade de classificação persiste quando as emoções do espectador fundem-se numa percepção racionalizada à posteriori sobre o filme, os seus personagens, o argumento, a estética e as mensagens que julgamos ver nas passagens subliminares com que o realizador nos pode ter brindado. Já com “O Fantasma” foi assim: um gosto descontente por um filme que retrata um desejo doentio, amoral e sem futuro, com personagens que emergem de um imaginário estranho e no mínimo distante. Mas ao mesmo tempo uma pontaria certeira na escolha de actores, nos cenários da cidade onde me movo e que amo, nos (talvez) apenas pormenores do filme que mais parecem bocados de vidas que se conhecem, retratos instantâneos de pessoas e situações muito familiares. E por este olhar do realizador somos levados para este universo tão próximo ao mesmo tempo que mergulhamos numa narrativa em que a esquizofrenia é central e as personagens parecem estranhos que sempre viveram ao nosso lado e que João Pedro Rodrigues agora nos revela em filme.
Não é um cineasta gay, afirma João Pedro Rodrigues. Simplesmente é um homem gay e um cineasta que trabalha sobre a realidade que conhece e que vive. Embora “realidade” seja uma palavra estranha para os classificar, é inegável que o desejo e o amor nos seus filmes não têm as barreiras da orientação sexual ou da moral heterossexista.
Odete tem a crueza dos amores perdidos, o desespero das vidas aparentemente inúteis e a beleza de um cinema feito com paixão. Revela dois óptimos actores, Nuno Gil e Ana Cristina Oliveira (Teresa Madruga já sabíamos que era). Por tudo isso, absolutamente recomendável.
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