!DOCTYPE html PUBLIC "-//W3C//DTD XHTML 1.0 Strict//EN" "http://www.w3.org/TR/xhtml1/DTD/xhtml1-strict.dtd"> Panteras Rosa

domingo, agosto 05, 2007

Poder da medicina e sexualidade

O lugar do médico na sociedade tem vindo a mudar nos últimos anos: à medida que o conhecimento científico deixa de ser um exclusivo dos técnicos e passa a estar partilhado por toda a sociedade (com as limitações inerentes ao excesso inacreditável de conhecimento nesta área que todos os dias é produzido), o médico deixa de ser o sacerdote de deus, o missionário detentor de um poder extraordinário para passar a ser alguém que detém uma informação valiosa para o seu utente (não doente, mas sim utente) e que deve decidir partilhá-la ou não! E é nesta decisão de partilha que surge o primeiro problema: à medida que o conhecimento passa do médico para o utente, este técnico deixa de ter o poder de decisão todo na mão e passa a partilhá-lo! Isto acaba com o poder exclusivo dos médicos (o que chateia muitos) e permite envolver o utente nas decisões sobre a sua própria vida (dando-lhe autonomia sobre o seu corpo, a sua saúde e a sua vida). Portanto, este é um problema sobre quem detém o conhecimento e, na sua consequência, quem está em posição de decidir sobre a vida de alguém!

Ora, sabendo nós que a questão do poder do conhecimento pode ser resolvida com a simples partilha de informação médico-utente (e claro que há alguns, especialmente médicos, que se ficam por esta base, tentando defender a todo o custo o seu lugar priveligiado na sociedade), resta-nos discutir o que significa ser autónomo e ter legitimidade para decidir sobre aquilo que é a única propriedade privada inalienável do ser humano - o corpo! E então na história surgem os primeiros confrontos entre grupos sociais oprimidos defendendo a sua autonomia e o poder do conhecimento médico anexado a uma elite de estudiosos e clínicos que se recusa a partilha-lo com o resto da sociedade! E nos primórdios surgem, pasme-se, as feministas, na sua luta pelo direito ao aborto, pelo direito a planear a sua maternidade ou a recusá-la, pelo direito a usar métodos contraceptivos, etc... No Portugal do séc. XXI, as leis da república, já contemplam (felizmente) o direito à mulher decidir sobre o seu corpo, em deterimento do poder regulador do conhecimento médico - EVOLUÇÃO!

Mas no Portugal e no Mundo do séc. XXI, a sociedade ainda não percebeu, que a autonomia em relação ao corpo próprio, à sexualidade livremente vivida, ao comportamento e papel social adoptado, ao género ou à recusa deste, são construções fundamentais para a liberdade individual de tod@s e para a integração social de um tecido humano, que se quer cada vez mais justo, solidário e diverso!

A medicina é um intrumento da humanidade e não uma instrumentalização desta! E é como instrumento colectivo que deve ser usado em proveito de cada um - a saúde é "o tal bem-estar físico, psíquico e social" e portanto todo o conhecimento, não só o biológico, mas também aquele que cai no domínio da psicologia e da inserção social, é conhecimento útil e colectivo!

Por isso defendo que a medicina não deve ser um instrumento regulador do nosso corpo e da nossa sexualidade, mas sim um instrumento de promoção de bem-estar e de utilização consciente individual. Não cabe ao médico nenhuma decisão sobre o seu utente, cabe ao utente decidir de acordo com o conhecimento médico que lhe é fornecido. Não cabe ao médico diagnosticar nada que o utente livre e conscientemente, não queira ver diagnosticado! Não cabe ao médico tratar um corpo que não é o seu, cabe-lhe informar e apenas informar e tratar quando o utente assim o decidir!

A medicina não é uma regulação das nossas consciências, mas sim algo que é regulado pelo bem-estar de cada um!

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quinta-feira, junho 14, 2007

MÉDICOS CONTRA DISCRIMINAÇÃO NA DOAÇÃO DE SANGUE

rui pato
Hoje, Dia Mundial do Dador de Sangue, a associação MÉDICOS PELA ESCOLHA, em conjunto com o Coordenador Nacional da Luta Contra o VIH-Sida, Henrique Barros, e o G.A.T. (Grupo Acção e Tratamento VIH-Sida), realizou uma conferência de imprensa em Lisboa pela revisão das normas e procedimentos na recolha de dávidas de sangue, pelo fim da discriminação de dadores homossexuais masculinos.
Expomos as posições enunciadas, com uma nota de satisfação por serem finalmente os profissionais de Saúde a reconhecer a incorrecção e a inexistência de base científica para a discriminação existente.







Comunicado MÉDICOS PELA ESCOLHA, 14 de Junho de 2007, Dia Mundial do Dador de Sangue:
Médicos defendem aplicação das normas europeias

No Dia Mundial do Dador de Sangue, a associação Médicos Pela Escolha entende prestar o seu contributo público à causa da dádiva de Sangue, questionando os motivos da manutenção do critério "Práticas sexuais com pessoas do mesmo sexo (dador masculino)" entre os factores que determinam a exclusão de potenciais dadores de sangue.
Porque essa forma de discriminação não garante uma melhor qualidade dos produtos armazenados nos bancos de sangue do nosso país e porque, em termos de saúde pública, não só já não faz sentido falar em grupos de riscos como pode mesmo ser prejudicial, defendemos a sua abolição.
Porque a questão primordial, em termos de saúde, é a obrigação de garantir a protecção de quem necessita ser transfundido, a associação Médicos Pela Escolha defende que a primeira abordagem ao eventual dador, feita na forma de recolha de dados anamnésticos, seja o mais pragmática possível, não incite à mentira nas respostas e que seja SEMPRE entendida como uma primeira forma de rastreio.
A recolha de elementos clínicos relativos à sexualidade do sujeito deve incidir sobre os comportamentos sexuais, e não sobre um critério arbitrário e irrelevante para a protecção do produto sanguíneo e do seu receptor, como é o da orientação sexual ou o da existência de contacto sexual entre homens.
A homossexualidade masculina não é factor predisponente para nenhuma doença, sendo também duvidoso que possam ser triados comportamentos sexuais de risco especificamente homossexuais.
É, aliás, de notar a incoerência quando o referido critério está ausente na selecção dos candidatos a doação de medula óssea.
O Plano Nacional de Saúde 2004/2010 admite a insuficiência das dádiva de Sangue a nível nacional, a necessidade da uniformização dos critérios de avaliação das dádivas e a urgência da implementação de um sistema de hemovigilância adequado. É Portugal que se atrasa na adopção da Directiva Europeia 2004/33/CE, que vincula automaticamente os Estados-membros e não contém qualquer referência à discriminação de dadores homossexuais:
(
http://europa.eu.int/eur-lex/pri/en/oj/dat/2004/l_091/l_09120040330en00250039.pdf ):
"Permanent deferral criteria for donnors of allogeneic donations (…)
Sexual behaviour: Persons whose sexual behaviour puts them at high risk of acquiring severe infectious diseases that can be transmitted by blood".
Afinal, como esclareceu em 2002 o Ministério da Saúde quando questionado sobre os passos e testes "aplicados na triagem do risco da doação de sangue contaminado nas instituições hospitalares" e o seu grau de fiabilidade:
"Todos os dadores de sangue são sujeitos a triagem clínica efectuada por médico (obrigatória pela legislação portuguesa). O candidato a dador é questionado claramente sobre os pontos relevantes contidos no guia "Critérios de Selecção de Dadores de Sangue". Após esta etapa e caso se verifique a elegibilidade do dador para a doação, e realizada esta, a sua dádiva será submetida a um processo de rastreio laboratorial que engloba as análises obrigatórias por legislação portuguesa (HIV1 e 2; HTLVI/II; Anti-HCV; HBs Ag; Anti-HBC; e, ALT), com testes cuja sensibilidade e especificidade ronda os 99%.
Estão em ensaio e a ganhar a natural destreza técnica os profissionais, que vão realizar as novas técnicas de Amplificação de Ácidos Núcleicos (TAN), para completar o painel de análises ao sangue doado, garantindo a este um acréscimo de segurança viral, conforme o actual estado da arte."
Importa notar que os referidos TAN passaram entretanto a ser utilizados, com consequente aumento da fiabilidade dos resultados: diminuiu a ocorrência de falsos negativos e foi significativamente encurtado o "período de janela", período de tempo em que os testes não identificam a infecção apesar de esta existir, que atingia os seis meses e que, com este tipo de avaliação laboratorial varia entre uma a duas semanas.
No entanto, embora o critério discriminatório "homens que têm sexo com homens" tenha sido retirado da página do Instituto Português do Sangue (IPS) em 2005, mantém-se nos manuais que já "estão a ser revistos" desde, pelo menos, essa altura. Tarda a publicação da dita revisão e a nova Lei Orgânica do IPS.
Importa também atender à realidade do sistema de dádiva de sangue. As associações LGBT têm alertado para grande disparidade na forma como as normas são interpretadas e aplicadas em diferentes estabelecimentos de saúde ou dependendo do pessoal médico responsável, relativamente aos homossexuais masculinos candidatos a dador. Confirma-se, portanto, a necessidade de harmonização das regras e da sua correcta aplicação.
Só a testagem de TODO o sangue permite uma maior segurança e qualidade de todos os produtos hemáticos, sangue e seus derivados.
Médicos Pela Escolha
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Declaração do Doutor Henrique Barros, Coordenador Nacional da Luta Contra o VIH-Sida, 14 de Junho de 2007, conferência de imprensa da MPE:

"A dádiva de sangue é um problema social, psicológico, profundamente humano. Mais que um problema médico. É a manifestação de uma responsabilidade e de um gesto ético. Actualmente, com a tecnologia disponível, as transfusões são essencialmente um gesto técnico seguro. Não se aplicam naturalmente as lógicas limitantes de um qualquer princípio da precaução para além dos limites da boa prática clínica.
Os modelos de rastreio selectivo, por passos, baseados em características dos individuos ligadas às suas escolhas pessoais ou estilos de vida, sem referência a marcadores biológicos, são cientificamente inválidas, promovem o desperdício e levam inevitavelmente à discriminação e ao estigma. Por isso, não há qualquer sentido em eliminar dadores com base na sua orientação sexual."

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quinta-feira, maio 25, 2006

Lei da Reprodução Medicamente Assistida

Ou a oportunidade para a discriminação imbecil

Comunicado Panteras Rosa

A Assembleia da República vota hoje uma proposta de Lei sobre Reprodução Medicamente Assistida. Sem surpresas, a proposta da maioria que suporta o governo será aprovada depois de um debate que não envolveu particularmente nem os profissionais de saúde, nem a sociedade civil. Neste país, a reflexão e a produção legislativa continua reservada aos especialistas da política, muitas vezes de costas voltadas às realidades sociais.

O Projecto Lei em causa, tendo a vantagem de regular práticas médicas essenciais para a saúde reprodutiva, ao excluir as mulheres sós e os casais de lésbicas da possibilidade de serem artificialmente inseminadas, fere gravemente o principio da não-discriminação e de uma sociedade plural em que os modelos de família são múltiplos e todos legítimos.

Maria de Belém Roseira, ex-Ministra da Igualdade, deu a cara por esta aberração. Evocou argumentos financeiros para concluir que os casais heterossexuais com problemas de infertilidade são os únicos que merecem o apoio do Estado para resolver os seus problemas reprodutivos. Para esta responsável política pelo projecto que vai a votos amanhã, as lésbicas e as mulheres sós em geral não terão, consequentemente, condições e autoridade para decidir a sua própria reprodução. É a velha história de que fora do casamento heterossexual os filhos são uns “coitados”, cheios de problemas afectivos e de carências de toda a ordem. Mas esta é a análise do senso comum conservador, do reaccionarismo de um país demasiado tempo submisso aos preceitos católicos impostos pela força das leis, de uma moral que não resiste a qualquer análise ou estudo científico a propósito das pessoas em causa. Porque desde há muito que as mulheres sós, lésbicas ou heterossexuais, têm filhos e porque os casais de lésbicas também os vão tendo. Ao legislador só competirá olhar para a realidade e garantir que as leis propostas não discriminam em função de uma qualquer crença religiosa ou moralismo de senso comum.

Mas que esperar de um país em que um Magistrado do Ministério Público, recentemente, justificava a sua decisão ao negar a possibilidade para o casamento civil de duas mulheres, com as seguintes afirmações: “O estado não pode tratar da mesma forma casais heterossexuais e casais homossexuais” e ainda “só através do casamento de pessoas de sexo diferente [é que o Estado consegue] o objectivo de preservação da espécie e da socialização de crianças”?

Por mais que a Assembleia da República vote hoje uma lei discriminatória, continuarão a existir vários modelos de família, pessoas do mesmo sexo que se amam e que querem e têm filhos, gente que vai a Espanha ou a outro país fazer as inseminações que aqui não são possíveis. Hoje a sala do plenário da Assembleia da República vai estar grande para tanta pequenez.

As Panteras Rosa – Frente de Combate à Homofobia, não esquecerão e juntam esta e tantas outras razões para a luta pela igualdade mais absoluta e sem excepções, contra a pequenez do país em que vivemos.

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