PORQUE É QUE O 'QUEER LISBOA' TEM HOJE UM ESPAÇO EM BRANCO NA PROGRAMAÇÃO?
*Comité de Solidariedade com a Palestina - UMAR, União Mulheres Alternativa e Resposta - SOS Racismo - Panteras Rosa, Frente de Combate à LesBiGayTransfobia - Pobreza Zero – GCAP - Portugal Audiência Portuguesa do Tribunal Mundial sobre o Iraque - Colectivo Múmia Abu Jamal - Ass. Amizade Portugal-Sahara Ocidental
"Caro João escrevi-te há uns dias, manifestando as minhas preocupações sobre o financiamento que o vosso excelente festival Queer Lisboa recebe da Embaixada israelita (bilhete de avião, envio de material impresso, etc.). Como sublinharam activistas queer, tanto palestinianos como portugueses, este financiamento viola o apelo de 2005 da sociedade civil palestiniana, que pede aos artistas e académicos para boicotarem o Estado israelita, em protesto contra a ocupação que prossegue. Respondeste-me (e aprecio o teu esforço, sabendo como certamente estás ocupado!), que este financiamento é usado apenas para apoiar a participação de realizadores de filmes israelitas no vosso festival - não é usado para turismo ou branqueamento, ou para promover de qualquer modo o Estado israelita. E no entanto ... não é precisamente isso que a PACBI (Palestinian Academic and Cultural Boycott of Israel) identifica como a cortina de fumo da "normalização", a ilusão do business-as-usual -- intercâmbio cultural "inocente" com o Estado israelita como forma de desviar as atenções da sua guerra em Gaza, do seu massacre da flotilha, da sua construção de novos colonatos? Receamos que o Estado israelita continue a proceder como um energúmeno pária, ignorando toda a pressão internacional, enquanto um intercâmbio cultural desse tipo continuar a recompensá-lo, emprestando-lhe verniz à sua alegação de ser um Estado pró-queer. Dizes tu que simpatizas com as questões levantadas - e, na verdade o Queer Lisboa é a justo título reconhecido como um dos mais respeitados festivais queer do mundo, com a vossa notável programação passada e presente a atestar a vossa esclarecida visão do cinema queer, que destaca as nossas diversas vozes, as lutas globais e as aspirações de activistas. Dizes que não há tempo para tratar agora desta questão - que a tua equipa se debruçará sobre ela uma vez que tiver acabado o festival deste ano. E, no entanto (embora eu possa certamente imaginar as circunstâncias específicas que vocês vivem), parece-me que do ponto de vista logístico é possível recusar HOJE o patrocínio da Embaixada israelita e encontrar uma fonte alternativa para pagar ainda o bilhete de avião em causa (Tel-Aviv-Lisboa, ida e volta, anda pelos 600 dólares). Podemos trabalhar juntos para encontrar uma solução. Lembra-te que ninguém te pediu para cancelares a presença do filme ou do realizador - exactamente o contrário. O que te pedimos para cancelares é o financiamento do próprio Estado israelita. Isto é o que Ken Loach pediu ao Festival de Edimburgo em 2007, quando soube que eles tinham aceitado 33 libras do consulado israelita. Depois da devida ponderação, o festival concordou com ele e recusou o financiamento, encontrando outras fontes para cobrir os custos e alojar os seus realizadores israelitas. Não poderás tu fazer a mesma coisa? Eu senti-me muito honrado quando o meu filme Fig Trees recebeu o prémio para o melhor documentário no ano passado. Senti-me muito honrado quando vocês escolheram o meu filme Covered para o vosso festival deste ano. E contudo, não posso em boa consciência participar de um festival que (passivamente) ajude a branquear o Estado israelita, mesmo que indirectamente. Se para vocês não é possível recusarem este financiamento da Embaixada, então é com grande tristeza que tenho de retirar o filme Covered do vosso festival. Este último ano foi palco de uma notável vaga de solidariedade queer para com a Palestina. Activistas queer como Judith Butler, Zackie Achmat, Sarah Shulman e Haneen Maikey pronunciaram-se, juntando as suas vozes às de grupos em Madrid, São Francisco, Toronto, Israel, na Margem Ocidental e agora em Lisboa, todos eles levando a cabo acções em apoio ao movimento de base BDS (boicote, desinvestimento e sanções), que é cada vez mais visto como a nossa maior oportunidade de contribuir para uma paz justa e duradoura na região. Junto com muitos outros, eu tenho a firme convicção de que nós, realizadores queer (e festivais queer) temos de cerrar fileiras e responder ao apelo dos nossos irmãos e irmãs da Palestina, protestando contra a violência de uma ocupação que atinge toda a gente, sejam gays ou heteros. Recusem o financiamento. Façam passar o chapéu para cobrir o preço do bilhete. Juntem-se a nós. Sinceramente, John Greyson"
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